Powered By Blogger

domingo, 17 de agosto de 2008

Reencontros

Festa popular, noite de sábado. O bairro inteiro decorado, ruas enfeitadas com esmero, uma grande maioria de gente jovem, além de bebuns, turistas e banheiros químicos espalhados por toda parte. Tati está na praça com os amigos de sempre, bebendo uma cerveja e sacolejando com a música embolada que sai das caixas de som.

De repente aparece o Jão.

-Tati, que surpresa, você por aqui! Gatona, como sempre...

Envergonhada, Tati tenta disfarçar a intimidade forçada de Jão.

-Oooooi Jão! Tudo bem? Sumido, você...

-É, estou indo embora. Cansei dessa vida proleta. Tô com saudades do meu país, da família, dos amigos...

-É mesmo?...Quando você vai? Tá feliz? É o mais importante, né?

-Sim, estou. Mas já viajo sexta que vem...

Jão lança um olhar comprido para dentro do decote de Tati, que ela finge ignorar. Não tem nada mais constrangedor do que um marmanjo perdido entre duas tetas, pensa consigo mesma. Mas contemporiza:

-Nossa, que sorte te encontrar, então...

Tati se aproxima para abraçar Jão, que corresponde já enlaçando-a pela cintura. Ainda que não seja mais uma virgenzinha, Tati não deixa de se surpreender com a canastrice do "ex". Ex, aliás, é uma boa definição generalizada: alguém que teve seu momento e caiu pra segundona. Mas sem ressentimentos nem mágoas, plis!

-Aquela escada te fez um bem incrível, diz o Jão pra Tati. Ela não tem remédio senão rir, afinal mora num sexto andar sem elevador!, mas acha o comentário dispensável. É que agora deu pra ser discreta.

Como uma metralhadora engatada, Jão dispara torpedos baratos, lembranças borrosas, cobranças sem sentido e frases de efeito em direção a Tati, que acha graça da situação absurda - um ex-whatever que monta um verdadeiro capítulo de novela só pra dar uminha - e se esquiva cada vez que ele tenta encurralá-la em alguma parede. Tsc, tsc. Por que homens desesperados sempre apelam para atitudes manjadas?

-Como você pôde apagar meu número do seu telefone? Como pôde esquecer do que vivemos juntos?

“Mas se nem era nada nesse nível...” pensa Tati, que faz uma careta e espera que sua atitude defensiva fale por si, mas Jão não capta a mensagem. Séria, ela então decide retribuir a canastrice, olhando com cara de tédio, bem dentro dos olhos dele.

-Desculpe, Jão, mas apaguei seu telefone, sim. Sinto muito. Sabia que a gente poderia se encontrar por outros meios, já que temos amigos em comum. Foi mal aê.

Ainda assim, Jão finge não entender o que Tati quer dizer. E dramático, insiste:

-Eu estou indo embora, Tati! Não sei quando volto pra cá...Você vai ter o desplante de fazer isso comigo?

Tati nem respira:

E você, Jão? Ainda não ouvi da sua boca você perguntar se eu quero a mesma coisa que você. O que eu quero, aqui, não tem importância não, é?

Meio atordoado, Jão olha pra Tati com cara de cachorro pidão, mas ela fulmina:

Aproveita e pára de me encurralar aqui que eu tô morrendo de calor!

-Nossa, Tati, tá nervosa...

-Ah, meu filho, no drama... Se você quer garantir sua última trepadinha antes de ir, se agilize. Não tá vendo a quantidade de mulheres ao redor? Por que você tem que cismar justo comigo? Tenha dó!

Tati sai de perto e se aproxima dos amigos. Tragicômico, Jão ainda arrisca um ou outro olhar de amante ofendido, mas Tati já não vê mais nada. Abstrai a cena em cinco minutos, como qualquer bêbado que se preze. E sai andando em fila indiana com a turma, pelo meio da multidão, pra lá de Marrakech.

E aí topa de frente com outro ex, de final também não esclarecido. A canastrice masculina domina:

Tati! Você sumiu, por onde andou todo esse tempo? Senti tantas saudades de você...

Ela sabia que logo, logo, eles se veriam de novo, já que o final havia sido abrupto demais. Dele, Tati realmente ainda esperava alguma coisa. Um olhar de encanto, um sobressalto, uma cerveja, o que fosse. Mas, assim de imediato, o reencontro não surtiu o efeito esperado, nem nada muito emocionante.

Mesmo assim, não se deram por convencidos e tomaram um táxi pra casa dela. Um último tira-teima, mas sem aquela chispa inicial. Adormeceram profundamente juntos, como íntimos desconhecidos. Tati aproveitou pra se esparramar na cama depois que ele saiu.

“Melhor deixar estar as coisas que já estão” , filosofou Tati de si para si , à noitinha, depois de sair de um filme meloso.

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

My sun my life

Barcelona vai bem, obrigada. Por mim e por ela, sim. Não tem como não gostar da Espanha, mas principalmente no verão. Um sol inclemente, quase inacreditável pra quem vem dos trópicos e pra quem é daqui, por causa do inverno. Ainda fico pasma com o contraste entre as estações extremas, e até já começo a ter mais simpatia pelo outono e pelo inverno, que tão graciosamente nos acomodam, ano após ano, para os tempos futuros...

É muito importante pra minha paz interior (kkkkkkkkkkkkkk!) ter consciência da dádiva que é viver pelo menos três meses de verão no ano. No Brasil a gente nem se dá conta disso, porque já somos abençoados pelo sol. Aqui, assim como aí, ele é artigo de primeira necessidade, mas também de luxo. De um hedonismo básico que todo mundo merece cultivar cada quando. Não à toa o bonde germânico-saxão-escandinavo baixa em peso por aqui. Eles passam mais da metade do ano sem ele. E são os mais pirados, claro.

Mas eu adoro a alegria deles, porque isso me lembra meu próprio país. Minha gente. Tempo de Carnaval vem à mente, que é quando culmina o final das férias daí, e às vezes vem de lambuja, em anos em que tudo volta a funcionar já no começo de fevereiro. Calor, muita gente junta, música, dançando de todo jeito, alegria alegria, tudo muito alto, em tons bem fortes. É que brasileiro, em geral, é assim mesmo, só espera uma deixa pra começar a se divertir. E tem maneira mais leve de levar a vida?