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quarta-feira, 13 de maio de 2009

A (minha) mãe desnecessária

Um fim de semana desses estava eu, em casa, ocupada com qualquer tarefa doméstica, quando me lembrei da minha mãe. Parece inconcebível que a gente esqueça da própria mãe, mas confesso que foi uma coisa muito natural, assim, de repente, resgatar a imagem do rosto dela, dos trejeitos, da gargalhada mais deliciosa do mundo, e sentir uma tremenda saudade.
Sou filha única e, para cúmulo da independência, ainda moro longe. A mais de 8.000 Km da minha mãe. Sei que ela sofre muito com a minha ausência, apesar de tentar esconder isso de mim. E muitas vezes quase me senti culpada por minhas escolhas de vida. Mas, graças aos deuses, tive uma educação extremamente liberal, justa e feminista -ainda que ela jure de pés juntos que isso não tenha sido premeditado- e por isso nunca, em nenhum momento da minha vida, ela me cobrou minha presença, me chantageou emocionalmente ou tentou me inculcar qualquer sentimento de remorso por ser uma pessoa de espírito, digamos, nômade. Foi ela que me fez assim, criando-me para o mundo, para a vida, e não para ela e mais ninguém.
Uma meia hora depois abri minha caixa de emails, e encontrei esse texto, que ela havia mandado pra mim. Sincronicidade pura e simples, de mãe para filha.


A boa mãe é aquela que vai se tornando desnecessária com o passar do tempo.
Várias vezes ouvi de um amigo psicanalista essa frase e ela sempre me soou
estranha. Até agora. Agora que minha filha adolescente, aos quase 18 anos,
começa a dar vôos-solo. Chegou a hora de reprimir de vez o impulso natural
materno de querer colocar a cria embaixo da asa, protegida de todos os
erros, tristezas e perigos. Uma batalha hercúlea, confesso. Quando começo a
esmorecer na luta para controlar a super-mãe que todas temos dentro de nós,
lembro logo da frase, hoje absolutamente clara. Se eu fiz o meu trabalho
direito, tenho que me tornar desnecessária.

Antes que alguma mãe apressada venha me acusar de desamor, preciso explicar
o que significa isso. Ser 'desnecessária' é não deixar que o amor
incondicional de mãe, que sempre existirá, provoque vício e dependência nos
filhos, como uma droga, a ponto de eles não conseguirem ser autônomos,
confiantes e independentes.

Prontos para traçar seu rumo, fazer suas escolhas, superar suas frustrações
e cometer os próprios erros também. A cada fase da vida, vamos cortando e
refazendo o cordão umbilical. A cada nova fase, uma nova perda é um novo
ganho, para os dois lados, mãe e filho. Porque o amor é um processo de
libertação permanente e esse vínculo não pára de se transformar ao longo da
vida.Até o dia em que os filhos se tornam adultos, constituem a própria
família e recomeçam o ciclo. O que eles precisam é ter certeza de que
estamos lá, firmes, na concordância ou na divergência, no sucesso ou no
fracasso, com o peito aberto para o aconchego, o abraço apertado,o conforto
nas horas difíceis.

Pai e mãe - solidários - criam filhos para serem livres. Esse é o maior
desafio e a principal missão. Ao aprendermos a ser 'desnecessários', nos
transformamos em porto seguro para quando eles decidirem atracar.

Márcia Neder
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