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sábado, 6 de setembro de 2008

Savoir-vivre em comunidade

Ainda não ganhei na loteria, mas posso dizer que tirei a sorte grande. Acabo de alugar um quarto de sonho em um apartamento dos sonhos. Até de quem vive a realidade das casas compartidas, como eu, aqui na Europa, que se traduzem em pepinos-do-lar básicos, contas altíssimas, móveis pavorosos, caquéticos e/ou insuficientes (viva Ikea e lixo mobiliário compartilhado!) e o pior, gente esquisita com hábitos heterodoxos.

Morar com outras pessoas é uma relação que está começando a se desenvolver no Brasil agora, que muita gente começa a perceber as vantagens de sair da casa dos pais. Entendo quem fica, mas ir em busca de independência é muito mais instigante, pelo próprio desafio de mudar. De casa, de ambiente, de rotina, de vida.

Pois bem. Aqui todo mundo divide apartamento. E não apenas os estudantes de fora, mas também adultos como nós, na casa dos 30 anos, formados, trabalhando, muitas vezes casados. E até com filhos, quando rola uma boa sintonia na casa.

Funciona assim: alguém descola um contrato de aluguel. Ou seja, arca com as exigências hercúleas da coisa, como contrato de trabalho permanente (quase todos são temporários), aval bancário para mais de seis meses, o aluguel em si e comissões de imobiliárias. Ou paga em cash uma fiança que, malfazendo contas, custaria o preço de um carro popular no Brasil.

E o que faz essa criatura? Subloca os quartos do apartamento a preços altíssimos e não paga aluguel. Os outros pagam o apartamento. Trocando em miúdos, é a forma mais corriqueira de abrir um negócio aqui.

Mas as pessoas chegam e saem, então a rotatividade nas casas é grande. As coisas funcionam na base da hierarquia. Quem está há mais tempo na casa muda pro melhor quarto e quem chega por último quase sempre fica com o pior, que é justamente o que se tenta alugar para os que vêm de fora.

Um breve parêntese: os quartos de apartamentos espanhóis são os piores do mundo. Geralmente só um quarto na casa é realmente decente. O outros costumam dar para um pátio interno horroroso, sujo e nojento, porque ali se encontram todos os outros quartos e cozinhas e banheiros do prédio. Um corredor vertical de cheiros e barulhos que ninguém merece ter, ainda mais dentro do próprio quarto!

Como se não bastasse, ainda rola um casting básico. Você não escolhe um quarto, é o “quarto” que escolhe você. O, digamos, gerente do apartamento te mostra a casa, maquia os problemas da “comunidade” e ainda te entrevista. Discriminaçõezinhas mais corriqueiras: homens, fumantes, estudantes de intercâmbio universitário, desempregados. Mas todo mundo sempre se arranja.

Mas não acabou. Você ainda tem que se entender com as outras pessoas que vivem na casa. Ou mais bem se harmonizar, porque, empiricamente falando, tem gente que não dá pra entender.

Filha única muito satisfeita, sou obrigada a admitir que é um interessante, e em muitos casos necessário, exercício de convivência. Difícil como o quê, porque afinal trata-se de dividir a sua casa com gente que, a princípio, você nem conhece. São outras educações, outros horários, outros hábitos de higiene, outros momentos de segunda-feira às oito da manhã. Lixo acumulado há uma semana que ninguém lembra de descer. Pia lotada de louça suja quando você precisa cozinhar. Banheiro ocupado naquelas horas. Assaltos a geladeira. Falta de privacidade.

Daí pensei prós e contras e decidi pagar mais caro por um quarto enorme. Cheguei à conclusão de que preciso ter uma casa dentro do apartamento. Só nesse território, dentro da casa que eu posso ter, aqui, posso exercer todas as minhas deliciosas liberdades e neuroses de mulher.

4 comentários:

Pat disse...

Poxa, quero tomar um drink nesse quarto aí.

Gordinha engraçadinha disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Gordinha engraçadinha disse...

Concordo com cada palavras. Aqui, em Londres, funciona assim. Feliz daquele que conseguiu seu proprio espaco.

Tou indo pra Barcelona domingo proximo. Jacque me mostrou seu blog. Ta frio dai?

Gordinha engraçadinha disse...

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